INFORMATIVO COVID-19

CONTRATOS E O COVID-19

Como ficam os contratos afetados pelos impactos da crise?

O covid-19 e a pandemia declarada, mutatis mutandis, atinge os mais variados setores da economia, barrando ou criando enormes dificuldades para empresas e até mesmo pessoas físicas em cumprirem seus contratos. Em face da situação descrita, quais seriam as soluções jurídicas aplicáveis e pertinentes?

Apesar da novidade da crise enfrentada, o campo do direito, com o decorrer de seu aperfeiçoamento histórico, criou institutos para controlar problemas dessa natureza. Tais institutos cuidam da problemática envolta aos contratos de forma a suavizar o princípio os contratos devem ser cumpridos – pacta sunt servanda, suavizando os potenciais efeitos maléficos.

A teoria de imprevisão, caso fortuito e força maior, onerosidade excessiva, são os institutos frequentemente empregados no direito brasileiro.

Conforme exposto no tópico de introdução do presente estudo, os três institutos jurídicos em comento possuem diferentes abordagens para situações como a crise ora enfrentada.

Pende e se faz necessário, no entanto, a análise pormenorizada e circunstancial do caso em concreto, de forma analítica.

Assim, o problema possui várias facetas, a ver:

1) Seara/segmento aplicável do direito ao contrato em tela: direito do consumidor, do trabalho, administrativo, civil, etc.;

 2) Natureza do contrato: comutativo x aleatório; tipo contratual; de meio x de resultado x garantia; etc.;

 3) Existência e presença da boa-fé, objetiva e/ou subjetiva;

 4) Ramo de atividade do contrato;

 5) Impactos em face da capacidade do contratado manter e cumprir suas obrigações; e

 6) Possibilidade de alternativas para que a parte contratada continue a cumprir suas obrigações.

 Por certo que cada instituto, quando aplicado, leva a diferentes efeitos.

Em primeiro lugar, para a teoria da imprevisão, o resultado a ser percebido é a justa revisão dos valores do contrato, visando o reestabelecimento do equilíbrio econômico prejudicado pelo evento imprevisto.

Em segundo, já a onerosidade excessiva, trata-se de pedido feito pela parte prejudicada de rescisão contratual, cabendo à outra a possibilidade de oferecer ajustes com intuito de preservar o vínculo, porém em novas diretrizes.

Por fim e enfim, para a força maior, a um, o resultado é a exoneração da responsabilidade pelo descumprimento do contrato; a dois, a suspensão das obrigações, enquanto temporário seja o evento ou definitivo, até que inviabilize a contratação.

À vista disso, no presente momento, a julgar pelas circunstâncias de cada contrato, todos os institutos acima podem ser aplicáveis, a depender de como tenha sido prejudicado de forma substancial pela covid-19.

No tocante aos novos contratos firmados já com a ciência dos efeitos da pandemia do COVID-19, é relevante que as partes pactuem expressamente a alocação dos riscos da pandemia, não sendo passível de aplicação os institutos supra referidos nestes novos contratos.

Contratos Administrativos

No que diz respeito aos contratos administrativos, a legislação pátria determina que diante de evento imprevisível ou inevitável, a Administração Pública será responsável pelo reequilíbrio econômico-financeiro dos contratos, conforme se percebe da leitura conjunta do art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal e do art. 65 da Lei nº 8.666/93.

Novamente, como em outros casos tratados pelo presente estudo, a possibilidade de revisão dos contratos repousa nos institutos da teoria da imprevisão, onerosidade excessiva ou força maior, todos melhor explanados no tópico de introdução do presente estudo.

Quanto aos fornecimentos emergenciais para órgãos públicos​, ainda que a Lei nº 13.979/2020 (Lei da Covid-19) estabeleça a possibilidade de dispensa de licitação para aquisição de bens, serviços e insumos de saúde destinados à emergência de saúde pública (aquisição de medicamentos e equipamentos, contratação de serviços especiais de publicidade, segurança, transporte, tecnologia da informação, comunicação, entre outros), algumas cautelas são recomentadas para evitar futuros problemas, como ações de improbidade ou processos administrativos ligados a estas contratações.

Assim, recomendamos que as empresas que pretendam contratar com o poder público nessas hipóteses observem: a reputação dos agentes públicos responsáveis pela contratação, conferindo o histórico de eventuais processos e condenações por atos ilícitos; a efetiva necessidade da contratação e sua vinculação com a crise do Covid-19, a fim de evitar futuros questionamentos que apontem eventual desconexão da contratação com a crise, ou ainda da quantidade de serviços/produtos contratados em relação ao fim pretendido pelo órgão público contratante; e por fim, o alinhamento do preço contratado com as demais contratações semelhantes já realizadas pela administração pública em contratos similares.

Contratos internacionais

 A maioria das principais economias mundiais, como Brasil e China, são signatárias da Convenção de Viena sobre Compra e Venda Internacional de Mercadorias (CISG). Esta Convenção traz uma fusão de diversas legislações e costumes praticados no comércio internacional, e prevê em seu artigo 79 disposições que entendemos pertinentes destacar para interpretação da situação vivida por conta do Covid-19:

(1) Uma parte não é responsável pela inexeção de qualquer das suas obrigações se provar que tal inexecução se ficou a dever a um impedimento alheio à sua vontade e que não era razoável esperar que ela o tomasse em consideração no momento da conclusão do contrato, o prevenisse ou o ultrapassasse,ou que prevenisse ou ultrapassasse as suas conseqüências.

(2) Se o não cumprimento de uma parte se ficou a dever ao não cumprimento de terceiro que ela encarregou de executar o contrato total ou parcialmente, aquela parte só fica exonerada da sua responsabilidade: (a) se estiver exonerada em virtude do disposto no parágrafo anterior; e (b) se o terceiro estivesse também ele exonerado, caso as disposições daquele parágrafo lhe fossem aplicadas.

(3) A exoneração prevista pelo presente artigo produz efeitos enquanto durar o impedimento.

(4) A parte que não executar as suas obrigações deve comunicar à outra parte o impedimento e os efeitos deste sobre a sua capacidade de cumprir o contrato. Se a outra parte não receber a comunicação num prazo razoável contado a partir do momento em que a parte faltosa conheceu ou deveria ter conhecido o impedimento, esta fica responsável pelas perdas e danos decorrentes da falta de recepção da comunicação.

(5) As disposições do presente artigo não impedem as partes de exercer qualquer dos seus direitos, salvo o de obter indenização por perdas e danos, nos termos da presente Convenção.

Assim, na hipótese de haverem contratos de natureza internacional que sofram abalos por conta da Covid-19, recomenda-se que as partes documentem os reflexos impeditivos que influenciem negativamente no cumprimento do contrato, que comuniquem de prontidão os demais integrantes da relação contratual acerca dos impedimentos experimentados, e que se certifiquem de exigir também de terceiros vinculados à obrigação que documentem eventuais impedimentos experimentados.

Por Danilo Borges Paulino.

© Copyright Borges e Tavares Advogados Associados